quinta-feira, 29 de outubro de 2009

barulhinho bom - por Nine

Barulhinho Bom...

Esquina parada, deserta, quase ninguém por aqui... Não me conformei, resolvi escrever, fazer um pouco de barulho, para ver se aparece alguém...

Também ando sumida, estava correndo atrás de mais uma das minhas ilusões, trabalhando, criando coisas para casa. Agora estou numa fase "queroumacasalinda". Mudei todas as almofadas dos sofás, fiz guirlanda de primavera, passarinhos de feltros... pareço uma Martha Steward dos trópicos, e com bem menos dinheiro, claro!

Vou visitar a filha n°1 na Ilha dia 4 e passar uma longa temporada lá de férias. Genro (deve ser doido querer sogra por perto!), filha e netos querem me convencer a mudar para lá. Enumeram as vantagens via Tim infinity (ainda bem que existe!) de morar numa cidade pequena, quase no centro do Brasil com um calor das Arábias e sem o Lawrence! Então estou entre: vender meu ap e ir para o Rio e ficar perto do filho N°3, mas que agora resolveu virar sitiante e está indo morar em Paulo de Frontin em novembro para plantar orgânicos numa fazenda de 100.000m, ou vender ap e ir para ilha junto da filha N°1, onde o custo de uma casa com piscina, varanda e jardins custa uma bagatela em relação à SP, capital...

Vida amorosa mais parada que essa esquina, tanto que já praticamente desisti dela. Resolvi entrar numa egotrip, eu me amo, esses caras que querem mulheres siliconadas e jovens quando já estão com mais de 50 anos, são uns idiotas de perderem minha maravilhosa, inteligente e prendada companhia. Azar o deles! Me divirto mais agora com minhas amigas, filhas, filho, primos e primas. Não é conversa da raposa com as uvas (quem não conhece a fabula, não brinca!). Ainda gostaria muito de encontrar alguém para ser meu par no que me resta de vida, mas cansei de procurar; talvez assim ele apareça.


Continuo com minha academia 5 vezes por semana quando meu ciático ou gripes me permitem, vou só para me exercitar e encontrar amigas. E sabe aquelas conversas de "feminices": falamos dos filhos, das liquidações, do preço da batata que subiu 3 vezes só esse mês no super (alguém sabe o porque? as chuvas talvez...), trocamos receitas, política dos americanos, do Brasil, do pré-sal, do Lula, de "fofices", de blogs bacanas etc... Enfim, estamos todas levando nossas vidas cotidianas sem muito glamour, mas em paz, tenho dormido bem, sem remédios... o que para mim é uma beleza!


Não emagreci um grama, mas aprendi novas receitas. Aliás, caro Visconde, fiz um peito de frango com laranja, gengibre e com louro, tomilho e alecrim, que creio não iria decepcioná-lo. Também ando a rainha dos muffins ou cupcakes, como preferirem, faço uns gostosos e lindinhos também.

Então é isso pessoal da esquina, estou vivendo minha vida, um passito de cada vez, no presente e estou bem comigo mesma. Minha amiga Janete, que é psicóloga, acabou de me convidar para um cruzeiro até Salvador em março, vão casados e descasados. Resolvi aceitar, nunca fui a cruzeiros, tenho meio preconceito, confesso. Mas ela falou que se divertiu bastante no último que foi, ela é super animada e vou experimentar. Ando assim, experimentando coisas... Experimentem também! beijos ao povo da esquina e saudades muitas de você, rainha!

Nine de Azevedo

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

que pese em minha defesa

“A distinta Rainha, por acaso, tem ciência de que, a prosseguir com as infinitas publicações de textos em seu blog, nós, da Associação dos Moradores e Amigos da Esquina do Desacato, podemos processá-la, junto a International Blogsfera Incorporated Trading Company, por ultrapassar em muito os limites razoáveis de ocupação do espaço internético?

Cara, tamanho volume de pensamentos veiculados está prejudicando a velocidade padrão da rede! Caso ainda haja alguma fagulha de responsabilidade social nessa privilegiada mente, pense nisso!

Sem mais e num mau humorzinho suprajustificável.

Atenciosamente,

Assessora Jurídica do nobilíssimo Visconde de Albuquerque.”



Só podia vir do meu maravilhoso amigo, o Visconde, convocação tão severa quanto irônica, a fim de retirar-me do silencio e me provocar novamente às palavras. Cogitei, dada à severidade do texto, encaminhar aos doutores do direito uma solicitação de resposta, mas, pensando bem e considerando o afeto que estreita nossa longa amizade, resolvi eu mesma partir em minha defesa. Eis minhas considerações.


Caríssimo companheiro e representante dos amigos desta esquina,


Ando procurando motivos para expulsar o descrédito.


Não me serve a nostalgia que embala Joaquim, o Ferreira dos Santos, que na 2ª feira, 21/09, ocupou meia página do nosso “maior jornal” com a saudade das suas lembranças: Bat Masterson, Biotônico Fontoura e Trio Esperança (Valham-me deuses!Todos e muitos!)... Tampouco desejo o champanhe ou o cianureto que a ira consagrada do Jabor, no dia seguinte, nos oferecia como opções para acompanhar as sucessivas coisas que não aguentamos mais. Dispenso a alienação. Recuso o suicídio. E agora? Talvez José Castello tenha me promovido uma saída, na sugestão da travessia do meu deserto. Mas por favor, meu caro, que ninguém me chegue por perto a sugerir catedrais... No máximo me ofereça a cumplicidade das pontes – essa coisa que encontra apoio para oferecer passagem sobre abismos.


Quero um motivo que me mexa dentro, por dentro, pelo avesso. Recuso barganhas com a consciência, fingimentos diante daquilo que se vê, e especulações verbais. Quero um trilho para percorrer com o bonde chamado desejo. Quero uma verdade que não apenas revolte, mas revolucione. Quero dizer sem meias-palavras, e se possível, sem formalidades nem setting. E depois visitar o silêncio e escutar os ecos do que vem de dentro. Quero pulsão, pulsação, plus-ação. Quero ser atravessada pelo presente. E de tal modo, que outrora seja apenas o caminho que me trouxe até aqui. Quero a força matriz, a força motriz, aquela que me responde sobre mim, que ancora e parte, parte e encontra, perde e procura, acha e devolve, e pergunta, e provoca e transpira.


É assim, meu amigo: ando buscando motivo que possa sustentar a palavra e seu plural, na aceitação do desafio de ouvir o silêncio e depois dele, a agonia dos ruídos a procura de sentido, de organização semântica e corpo fonético. Ando atrás do imprevisível, do sensível ao toque, do deslumbramento, que seja por um instante, mas de tal forma recoberto de intensidade, que vislumbre a eternidade.


Às vezes rodo às escuras, como sempre acontece quando vamos derivando na evitação dos riscos. De repente estanco, zonza pelo rodopio no mesmo, no inerte, no estéril, no inócuo. Outras vezes, caminho desvairada, desavisada, perdida da bússola e das estrelas, tateando no reconhecimento de referências em que nelas eu me reencontre.


E como você vê, passa uma semana e duas e mais, e as palavras não me parecem próprias, não me parecem o bastante para que mereçam dicção. Então se esvaziam antes mesmo de ganharem papel e nanquim.


Assim que recebi sua intimação ao banco dos réus, encasquetei verdadeiramente em busca de uma explicação que fosse além dessa sensação de inadequação e desejei com honestidade ter mais a dizer, mas esta é toda a minha verdade. Desculpe-me se o decepciono.


Ontem, noutra segunda-feira, fui procurar novamente o Joaquim. O que poderia me trazer depois das suas saudades? De que presente me contaria? Pra que futuro roubaria meu olhar? Qual o quê? Lá estavam as reminiscências mais uma vez... ai que cansaço que tenho do mesmo... vou te poupar os detalhes desta vez.

Um beijo,

Guilhermina

imagem:
Gestalt 02. - de L. F. Calaça
http://www.o_enforcado.blogger.com.br/

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

só uma palavra me devora - por Visconde de Albuquerque

Finalmente, eis o texto do Visconde que, em mim, operou uma revolução. Só agora, duas semanas depois, ele chega nesta esquina, para obrigá-lo a acreditar que há coisas que não precisam de datas. Este texto é assim: imortal. Beijo, Guilhermina

***

Rainha, minha provocante amiga,

Acordei com tua tese em torno da paz. Era sábado bem cedinho, tempo frio, chovia. O corpo pedia um pouco mais de calma entre os lençóis. Mas a mente, essa deseducada, em alvoroço, sem modos e sem dar-lhe ouvidos, ansiava por abandonar o calor dos travesseiros como um prisioneiro estuda formas de se livrar das espessas barras de ferro. De um pulo, sentei-me aqui.


É esta uma das agendas recorrentes que temos, tu e eu. Tanto é que voltaste a ela na última postagem. Tu, recusando-a, a paz, peremptoriamente - no que me aturdes. Eu, tendo que ouvir de Duda, como a proteger-me: "Quero para ti um pouco de paz". Ora, ora. Que enrascada. Também eu gostaria de um pouco de paz, Maria Eduarda. Quanto mais não seja, até para saber como é. Ainda pouco sabes de mim, meu benzinho, mas logo te alerto: não passo de um atormentado, em sistemáticas tribulações. Guilhermina, amiga que me vês como a um vidro, rogo-te - vá em socorro desta alma desprevenida e revela minha verdadeira identidade. Muito prazer, ansiedade, teu nome é Albuquerque. Tensão, teu sobrenome. Não te iludas com este ator, linda menina de olhos verdes. Onde queres família, sou maluco, como bem me definiste.


Por fora, champanhe à beira-mar a contemplar a lua. Por dentro, uma explosão de conflitos, contradições, guerras de napalm, paióis de dinamite, trincheiras, munição pesada. Encobertos pelas nuvenzinhas azuladas do papel de parede decorativo, descortinam-se grotões, canyons, despenhadeiros, cavernas. Disfarçado de um aspirante a druida, um gladiador. Por trás de um projeto mal acabado de lord inglês - dedicado à arte de agradar às mulheres, na leda ilusão de ser amado por elas -, um viking, um bárbaro, um pirata. Que ninguém nos ouça, estamos falando de um impostor. É questão de tempo ser desmascarado.


Ainda protegido pelo anonimato, observo os semelhantes ao meu redor. Como podem ter paz quando há tanto a ser visto, ouvido, lido, pensado, escrito, conversado, abstraído, estudado, trabalhado, descoberto, viajado? Se a vida é criação e recriação diárias, a exigir renovação incansável? Se há urgência no aprofundamento do que implora a alma, em mergulhar na escuridão? Se é preciso sofisticar o conhecimento, refinar os sentidos, apurar o paladar? Se são tantas, mas tantas, inesgotáveis as questões?


Onde a paz, se preciso conhecer Fernando de Noronha; aprender francês para ler "À la recherche du temps perdu" no original; provar o sorvete de tangerina do Mil Frutas; ouvir o CD de Nelson Freire sobre Chopin; cozinhar para o meu amor, fazê-lo sorrir e brincar na doce intimidade dos apaixonados; te ver feliz, bonita e desafiante como sempre, Guilhermina; abraçar meus amigos; construir utopias; assistir ao DVD de Mart`nália; ver o Cirque du Soleil; jantar no El Bulli; entrevistar Marina Lima; saltar de asa delta para vencer o medo de altura; aprender a perdoar? E, acima de tudo, tentar desesperadamente escrever algo que preste em tua esquina, minha adorada? Como é possível não ter pressa, se tanta coisa me interessa, inclusive a Paula Toller?

"Luto não contra os que compram apartamento e carros e procuram casar e ter filhos, mas luto com extrema ansiedade por uma novidade de espírito". Clarice Lispector. Sempre Clarice. Nada do que posso me alucina tanto quanto o que não fiz. E, à maneira de Calcanhotto, "eu não tenho pena dos traídos, eu hospedo infratores e banidos, eu gosto dos que têm fome, dos que morrem de vontade, dos que secam de desejo, dos que ardem". A ação circular de mais do mesmo me consome. Ruptura é palavra linda.

Paz. Sem tê-la, sigo a imaginá-la, quase a flertar com ela. Intuo que deva ser uma brisa, um sopro tão bom como olhar demoradamente a quem amamos, abraçar na nossa cama o corpo que tanto desejamos, sentir o cheiro do cabelo da namorada. Ou a saudade dela, quando sabemos que nos aninharemos em seus braços ao final de um dia de trabalho, em total entrega e abandono. Enquanto a paz não invade o meu coração, minha rainha, eu pensei em ti, eu pensei em mim, eu chorei por nós. Que não temos sossego. Eu ainda mais que tu, por - em virtude de tamanha intemperança -, nem ao menos fazer idéia do que vou ser quando (e se) crescer.


Deixo-vos com a inebriante "Canto Triste", de Vinícius e Edu Lobo (na voz deste), a qual amanheceu no mencionado sábado comigo:

http://app.radio.musica.uol.com.br/radiouol/player/frameset.php?opcao=umamusica&nomeplaylist=005756-3_10<@>Edu_e_Tom<@>Canto_Triste<@>Tom_Jobim/Edu_Lobo<@>0339<@>Edu_Lobo/Tom_Jobim<@>POLYGRAM<@>Mercury


E, para completar a trilha melancólica, mais duas de Vinícius (com Tom):


"Modinha", na voz de Elis.

http://app.radio.musica.uol.com.br/radiouol/player/frameset.php?opcao=umamusica&nomeplaylist=002090-4_04<@>Elis_e_Tom<@>Modinha<@>Elis_Regina/Antonio_Carlos_Jobim<@>0212<@>Antonio_Carlos_Jobim/Elis_Regina<@>POLYGRAM<@>Philips


"Serenata do Adeus", na voz de Eugênia Melo e Castro:

http://b.radio.musica.uol.com.br/radio/index.php?param1=homebusca&check=musica&busca=serenata%20do%20adeus#

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

se a gente se transforma no encontro

Meu amado amigo,

Quantas conjecturas sobre o futuro que já se adianta para o agora... diga-me uma coisa, para onde foi a infância? E pensar que eu gastava horas me perguntando o que haveria de existir no “tempo das minhas filhas” que me seria impossível de absorver... É curiosa essa expressão que determina os donos de cada tempo, não? Por estes dias, conversando com a minha mais velha, dona agora dos seus 22 anos, chamando a si mesma de adolescente (para meu colapso iminente!, é claro) sem nenhum constrangimento, mesmo diante do fato de que, justamente na minha passagem pela atual idade que visita agora, ela nascia. Querido, como é fresca na memória aquela sensação: a vida nos meus braços e o sentimento de que pela primeira vez eu fazia algo sem retorno, sem possibilidade de arrependimento, sem perhaps nem porém.

Pois, conversando com ela, escutei seu relato sobre as maravilhas dos anos 80, sobre certa paixão retrô que ela e as amigas nutrem pelo período, numa pretensa atitude cult, e da indignação que sentem quando as pessoas denominam como a “década do vazio” tal período da história da nossa humanidade. Enquanto a escutava, ia me lembrando da atração que a década de 60 exerce sobre mim. Será, meu caro, que ganhando a tecnologia, acabamos por precisar visitar o passado no qual nos forjamos para saber quem somos? Se isso faz algum sentido, vale guardar a capa do caderno Prosa e Verso do sábado, 22 de agosto – Um nome para este tempo. Talvez você possa presentear seus pimpolhos daqui a alguns anos, ajudando-os a conhecerem a si mesmos.

A esta altura, você deve estar pensando que esta sua amiga é mesmo do contra. Pois reafirmo: só o medo da perda (e repare, o medo, não o pânico) nos faz cauteloso com o que nos é precioso. Acho curioso o estigma que certos sentimentos ganham, como se carregassem contornos patológicos e só existissem nesse estado. Não conheço sentimento desnecessário. Nenhum. Cada um cumpre sua função e dela é Mestre. O desafio é sua dissecação de sentido até que possamos escutá-los. Só assim ouvimos a nós mesmos com a verdade inteira que podemos existir, plena de idiossincrasias, fragilidades e possibilidades.

E não é que continuo mais calada que falante? Ando pensando um bocado sobre o sentido da existência, pelo qual a vida não seja somente um cumprimento dos dias em intermináveis pagamentos de contas e acertos de dívidas. Faz pouco tempo situei esse sentido na diferença que fazemos no contato com o outro. Esse exercício mágico de transformar e sermos transformados no encontro.

Recentemente, enquanto eu pedia por um bom porquê para seguir escrevendo devaneios e dissidências por estas bandas, ocorreu-me fato instigante. Através do e-mail do outro blog – missivas do porto e do rio – no qual me correspondo com Cecília, recebi um bilhete de Mercedes, pessoa querida da minha vida, a quem não via há mais ou menos 15 anos. Não preciso dizer que emoção é palavra pouca para expressar o que experimentei nesse abraço, virtual só por enquanto, e por pouco tempo.

Em meio às notícias de lá e de cá, ela me conta que terminou uma pesquisa sobre a importância do afeto na apreensão do conhecimento. Pesquisa sistematizada por seu trânsito em Secretarias de Educação pelo interior do estado. Pesquisa que dedicou a mim, por segundo ela, tê-la provocado a pensar no assunto. Eu?


Pois bem, se fiz isso, quem era o eu capaz de fazê-lo? Onde guardei a contundência do discurso, da energia, da capacidade de contaminar o outro a privilegiar afetos? Eu mesma vivo me perdendo dos meus, vivo encaixotando-os como se fossem aqueles percevejos que, ao toque, exalam odor desagradável... vivo esculpindo máscaras e argumentos que convençam a mim e aos outros de que os afetos a solta ou te deixam vulnerável ou te tornam piegas e ultrapassados. Vivo guardando minha surpresa para conseguir conviver na hostilidade dos espertos, tão experts em dribles, em aritmética, em inteligências... Encontrar Mercedes foi como reencontrar a mim, aquela que aprisionei nos grilhões... e de quem me tornei feitora.

Meu Visconde, voltei correndo a sua última carta, ainda na minha caixa postal (para torná-la pública em breve). Voltei intuindo que algo dela me escapara, como se a tivesse lido por algum acesso muito restrito, pequeno, apertado. Não deu outra: só desta vez pude entregar-me ao deslumbramento da tua alma. E é por isso que te peço licença para preparar o espírito dos amigos para o que está por vir. Escutem.

Jura Secreta e Encontro das Almas

Eu agradeço a existência dos que me devolvem a mim, exigindo que eu seja o exercício do meu melhor, e do meu desafio em ser,

Um beijo,
Guilhermina



domingo, 23 de agosto de 2009

o procedimento é pegar um táxi até Miriam - por Visconde de Albuquerque

Guilhermina, meu camafeu, alvíssaras!

Finalmente, saíste daquele silêncio que não te pertencia. De teu estupendo texto, ficou martelando-me o trecho: "É absolutamente necessário que se tenha medo de perdê-lo (o amor), mesmo sabendo antecipadamente que isto é inevitável". Lembrei no ato de Sandra Pêra, queridíssima e a quem muito aprecio os pensamentos frenéticos, fitando-me profundamente ao dizer: "Não tenha medo de perder (o amor). Quem tem medo de perder, perde". Oh, urgia ganhar a rua e refrescar os tórridos miolos. Que fazer?

Fechei a padaria mais cedo para sair com as crianças. O moleque, de 8 anos, e a afilhada, de 1. Fomos no restaurante preferido...dele. Céus, nessa idade e já com point gastronômico. E de muito bom gosto, por sinal. Levei presente para todos: para ele (aparelho de som), para a mãe dele (CD do Toni Platão), para a baby (uma casinha de pelúcia, de onde sai um cachorrinho), para a mãe dela, minha comadre (DVD do Djavan). Contudo, fui eu quem ganhou o maior presente. Para tudo existe Mastercard, mas estar com quem amamos, encerra clichê, bem sei, é sem dúvida irreembolsável.

Enquanto sorvia o prosecco gelado, observava aqueles dois serezinhos. Um, a essa pequena altura do championchip, já portador de notebook (com o qual eu o havia presenteado ano passado) e celular, que acabara de ganhar (não de mim). Provoquei-o: "Vais me ligar?" Ele: "Claro" - mexeu os dedinhos e...meu celular tocou. Ou seja, ele já havia armazenado meu número na engenhoca. Disse-lhe: mas o senhor está me saindo um verdadeiro homem de negócios! Ele riu e, como bom leonino, deve ter se achado o próprio. Fiz questão que ele tivesse seu own computer, não para entretê-lo com joguinhos. Mas sim para que, em paralelo à moda antiga, usasse-o como nós próprios houvéramos feito com as caudalosas enciclopédias analógicas de antanho. Para pesquisas e trabalhos no colégio. Ele que, com 5 anos, logo após eu me separar de sua mãe, ao lhe perguntar como andava na escola, veio com essa: "eu brinco, me divirto, mas ensinar que é bom, nada." Está bom para ti? E lá ia ele, degustando as comidinhas deliciosas e operando o aparelho com tal desenvoltura que constrangia o nível máximo de tecnologia que domino na coisa: mandar uns torpedilhos. Até que, em meio a observações sobre os itens do cardápio da casa , - que se diga, não muito "normal" para o gosto médio de uma criança -, mandou um "procedimento" no meio da frase. Por Camões, "procedimento"? Lembrei-me de quando ele tinha 3 e perguntou-me o que era "experiência". Valei-me, protetor dos dicionários! Foi quando minha comadre contou que a única palavra que a bebê fala inteira é....mamãe? vovó? Não, prezados: "táxi". Pano rapidíssimo.

Meditei: se um com 8, está de note e celular, o que essa pirralha vai ganhar de presente na idade dele??? Disquei (disquei?) imediatamente para Miriam Leitão, minha nova e arrebatadora paixão (sem cenas de ciúmes, Waldvogel, if you please!), buscando aconselhar-me através de sua visão macrossocioeconômica e prognóstica do universo. Disparou-me a gênia: "Visconde, anacrônico colega, sê romântico, como te aprouver. Mas, tanto quanto possível, moderniza-te, rapaz. Vence a condição de camarada contemporâneo das fundações da Sé de Braga. Ainda causa-te espécie a frequência modulada, os mistérios impenetráveis de um singelo interfone ou até mesmo a ação de um mero dimmer na sala de estar, meu bom homem. Tudo te espanta, tudo pões na conta de mágica, de enigma indecifrável. Qué te pasa? Apruma-te, prepara-te. E, sobretudo, forra esses bolsos, companheiro. Com o que esperas presentear teu anjinho aos 8? Meias três quartos? Pega-varetas? A bisneta da Barbie? Francamente, meu amigo. Pensa em chips subcutâneos que ensinem a tocar instrumentos, como sonha Cora. Em roupas autolimpantes e passantes. Em exposições permanentes de Van Gogh no MAM. Em emagrecer sem me perguntar como. Enquanto choras pitangas como um bezerro desmamado com Roberto numa poltrona - que maçante! -, o mundo roda lá fora, pai de Matusalém. Deixa para trás o tempo em que batucavas num 286 movido a lenha, tio-avô de Fred Flintstone. Mas, acima de tudo, pensa alto, bem alto. Dá a essa brasileirinha - e ao brasileirinho - um Parlamento limpo. Roga aos céus não ter que indefinidamente mostrar-lhes onde estão os valores, a moral e a ética, pois que até lá seus representantes no governo estarão esterilizados e a decência será algo que nunca deveria ter deixado de ser o que é: crucial. Peleja para que não precises convencê-los exaustivamente de que honestidade é obrigação, e não exceção e virtude a merecer aplausos e condecorações. E chega que preciso desligar, para fechar mais uma de minhas colunas que tanto te vêm impressionando, por simplesmente falar do óbvio. Estou, com elas, tentando ajudar-te a presentear futuramente os teus. E tu, cidadão, o que tens feito?"

Assim, desligamos. Eu, mais apaixonado ainda por ela. Sim, és toda razão, colunista: preciso levantar da poltrona confortável. Essa pequena magrela de Caratinga, que coisa...Como tu, Guilhermina, também eu sonho com avenidas povoadas de reações ao tenebroso espetáculo em que diariamente homens enlameados até o talo autoproclamam ética e espírito público com uma desfaçatez, um desassombro e um linguajar torpe que, espero, essas crianças nunca precisem conhecer. Essa corja, essa malta que de nada se envergonha, quanto lixo! Sonho em rachar a canalha, amadurecendo a campanha verde de Marina Silva. Não vai levar, posto que é uma sem-máquina. Mas partirá a candidatura oficial. Que a campanha sustentável torne a outra insustentável. Aí, é pau no segundo turno. Pelo bom futuro dos fedelhos. Os meus, os seus e os nossos. Retribuo com amor o teu beijo, conquanto me deixas um tanto nervoso. E que nossos cônjuges não nos leiam. Em nos lendo, relevem-nos a travessura. Em nos relevando a travessura, liberem-nos para mais. A propósito, agradeço o envio da foto de meu calçado tirada em alegre noite de festa ao vosso lado. Julguei que daria uma perfeita ilustração para esta minha verborragia contumaz, ou seja, nada a ver com coisa alguma.

Mientras, vamos a alguns refrigérios para a alma, belezas no combate a tanta feiúra:

- A linda canção "Amores Possíveis", com Paulinho Moska: http://app.radio.musica.uol.com.br/radiouol/player/frameset.php?opcao=umamusica&nomeplaylist=005508-6_02<@>Amores_Possíveis<@>Amores_Possíveis<@>Vários_Artistas<@>0220<@>Paulinho_Moska<@>UNIVERSAL<@>
- O vídeo do incrível contra-tenor e barítono alemão Klaus Nomi: http://www.youtube.com/watch?v=yuSrsGzhD9U
- O vídeo da bela "Pérolas aos poucos", de José Miguel Wisnik, na voz de Ná Ozzetti: http://www.youtube.com/watch?v=VhSo-FX-x5M&eurl=http%3A%2F%2Fletras%2Eterra%2Ecom%2Ebr%2Fna%2Dozzetti%2F286815%2F&feature=player_embedded
- O áudio de "Entreolhares", do novo CD de Ana Carolina: http://anacarolina.uol.com.br/
- O aúdio de "Prima do ciúme", do novo CD de Antonio Villeroy: http://www.antoniovilleroy.com/obra_aberta/disco_novo-prima_do_ciume.php
- O site do canadense Leonard Cohen: http://www.leonardcohen.com

domingo, 16 de agosto de 2009

para viscondes e amigos

Meu Visconde, meu amado;

Você e essa sua ironia fina e sutil capaz de fazer as mulheres suspirarem, ávidas pelos galanteios que lhe são tão próprios. Quanto a mim, vejo-te com o indecifrável sorriso no canto da boca a deixar-me dúvidas. E ainda sobre estas, também não estou certa se me aflijo mais com a incerteza que me ronda quanto as tuas lisonjeiras palavras ou quanto a mim mesma. De todo modo, não me parece correto atribuir-me essa capacidade de acalmar as almas transtornadas, mesmo aquelas que se manifestam em resmungos. Além do mais, justo você, meu caro, como poucos, é testemunha de que não sou de paz. Ah, não! Muito antes pelo contrário, são as tormentas que me fascinam, são as revoluções.

As que aconteciam nas avenidas estudantis dos idos 68, cheias de sonhos, de ideais, de censuras a provocar a criatividade e a beleza das metáforas... Ah, como queria mais disto. Mas, não é só com saudade que visito estas cenas. A saudade faz tudo morar no passado e o sentimento que me assola traz a urgência a reboque, quero fazer presente a intensidade no que vivo hoje, tenho necessidade de matar a fome de verdade emocional.

Não sei em qual momento eu deveria trocar o verbo amadurecer pelo envelhecer. Não sei sequer se já passei da hora e fico por aí a mercê da galhofa alheia. Mas sei, isso sim, que a gratuidade de tudo que a vida tem, típica fantasia da juventude, já se foi. O sucesso, a riqueza, o bem-estar, a saúde, a beleza da forma, a alegria, o crédito, o reconhecimento, a realização e o que mais você quiser supor na vida é consequência de trabalho, insistência, teimosia mesmo. E alguma sorte... que como diz meu cunhado, os craques tem que ter sorte.

Desta feita, não me desespero mais na tentativa em vão de encontrar quem me faça feliz. Quero quem me faça companhia na felicidade que eu possa encontrar por mim e, já que é inevitável, também nos tempos, às vezes longos, de frustração e dor.

Aliás, dor é uma palavra que as pessoas têm horror, mesmo sabendo que não há economia que nos previna, e não há prevenção que nos proteja dela. Há de vir como a estiagem e a chuva sempre chegam. Nossa questão passa a ser o desenvolvimento de recursos, então. E não há recurso maior que o encontro amoroso. Intenso e verdadeiro, mas também cálido e apaziguador. Gratuito? Jamais. Antes, é preciso que seja caro, dispendioso de tempo, de energia, de investimento. Nada ao acaso, quase tudo conquista. É preciso que se tenha consciência do amor. E absolutamente necessário que se tenha medo de perdê-lo (mesmo sabendo antecipadamente que isto é inevitável). Mais imprescindível ainda, no entanto, é o medo de abandonar-se. Não é o outro que nos impede, que nos aprisiona, que nos torna dependentes. Somos nós que o fazemos por nossa própria incompetência. O outro, ou o amor, nos serve apenas como pretexto. Um mau pretexto. Um mau uso.

Sobre a liberdade, aquela para qual nunca é uma palavra que não existe, tomemo-la pela mão. Não há amarra mais singela posto que desprovida de força.

Meu amigo, as revoluções acontecem também no silêncio. Há na insatisfação uma força motriz de transformação: Um dedo apontado para a necessidade de fazer de outro modo, de rever o estabelecido, de sair da repetição do que nos leva ao mesmo destino.

É por aí que tenho andado, entre revoluções, reviravoltas e silêncios... Um tanto longos, é verdade, mas necessários, posto que neles me escuto com eco, e sem interferências.

Só mais uma coisa: saudade é testemunho, de que vida(!) houve. Quero guardá-la toda, como coisa minha, daquelas que não abro mão.

Beijo-lhe, desta vez na boca, por exigir de novo a minha voz. Para dizer-te, disse-me antes. Muito obrigada.
Guilhermina

terça-feira, 4 de agosto de 2009

como é grande o meu amor por você - por Visconde de Albuquerque

Rainha, minha incandescente amiga,

Teu telefonema hoje encheu-me de quentura e reviravoltas mentais. Coloquei uma plaquinha de volto logo na quitanda e fui caminhar na praia. Ato contínuo, vi-me a tecer conversações contigo, sempre animado e ávido a escutar-te, com invariavelmente tanta luz. Apaixona-me, por impressionante, teu universo em que nada é gratuito, bóia na superfície, patina a esmo. Chegas a mim como um invencível estopim a explodir memórias, sentidos, raciocínios. És uma brasa, mora! Desculpe-me a expressão popular, querida, mas é que escrevo, por mais que incrível pareça, ainda sob o impacto violentíssimo que foi o show de Roberto. Duda, a meu lado, entre incrédula, assustada e compadecida, olhava-me de esguelha, como a buscar entender o que se passava no imo de seu parceiro àquela noite. Pois que eu, copiosamente, chorava. A ponto de, diante de tantas emoções, passar-te um torpedo, amiga, procurando dividir contigo momentos de tão forte supressão da consciência, em que tudo era transbordamento.

Quando Erasmo começou a cantar, o Rei chorou. Erasmo chorou. Fiz o que? O que era mister: acompanhei a ambos. Éramos Erasmo. O jantar que Duda tão amavelmente trouxera, tal e qual o café da manhã do cantor de Cachoeiro, esfriava na mesa. Como interromper aquele desfilar de redemoinhos sensitivos? Não queria que o assado se transmutasse em caldo fumegante inundado pelas lágrimas em abundância.

Roberto, o Rei de tantos, do Brasil. E meu também. Dirás: mas e Buarque, seu nobre de meia tigela, aristocrata decadente, comprador barato de títulos e brasões forjados em falsificações rudimentares? Onde a fidalguia numa criatura que deita prantos à audição dos primeiros acordes de "Você" (com esta, na voz de Bethânia, já fizera poças no Canecão dois anos antes). Que vai dormir (consciente) embalado pelos noturnos de Chopin, mas que sonha mesmo (subconsciente) é com as boas e velhas canções do cavaleiro da Urca? À maneira de Dani, perdoa, querida, esse nobre vagabundo.

Mas, cáspite, do cordial filho de Sergio, o que falar? Acontece que as emoções de Francisco têm sempre porta-vozes, personagens, escudos. Mesmo Caetano e Gil se expõem, muito, em relação as suas vidas pessoais. Mas Roberto, esse é todo exposição. Tudo acontece na primeira pessoa. É ele, sempre, a falar dele. Do drama do acidente, do drama do filho, das relações com a mãe, o pai, com o melhor amigo. Da mulher que mais amou. Suas relações religiosas. Que artista, de primeira linha, se coloca como ele? Irmãos, é preciso coragem. Não há aquela máxima de que quem quer falar ao mundo que fale de seu quintal?

E Roberto tem sido incansável na abordagem de seu próprio pátio, sobretudo seus jardins de inverno e, mais sobretudo ainda, seus sítios de amores passionais. Muito me fascina esse campo das relações a dois. Quando eu era jovem e tolo (e isso se perde na noite dos tempos, embora a segunda característica continue valendo), não conseguia ver graça nas coisas do mundo na ausência de uma interlocutora amorosa. A visão de um entardecer, uma viagem, uma comida diferente, um resultado importante no trabalho, tudo isso se enfraquecia em valor se não merecesse a chancela de uma alma enamorada. Era eu quase que um terceiro autor de Inútil Paisagem (Tom Jobim & Aloysio de Oliveira). Ah, o bendito passar das horas, que não há só de encher-nos de rugas e cabelos brancos. Ao modo de um antijornalista, que nem sequer sabe o seu próprio lead, ignoro como, quando, onde ou porque essa percepção modificou-se. Mudei eu. Roberto, não. Porque só muda quem precisa mudar.

Hoje, obstino-me, com todas os meus dínamos, a explorar meus jardins de inverno, outono, primavera, verão. Dedico-me a promover excursões permanentes ao meu meio rural, zonas interiores, ambientes inóspitos, regiões desérticas, fronteiras glaciais, paisagens camufladas. E quão trabalhosas são essas expedições! Que labor o exercício da própria construção. Quanta solidão e tijolos nessa procura. Quisera ser compositor, para refazer em canções lindas as pegadas antigas e frescas de tantas viagens. E, rainha - não sei bem porque (muitos risos) -, é esta uma agenda que tanto me transpõe a ti. Eu tenho tanto pra lhe falar, e é com as palavras do Rei que sei dizer: Como é grande o meu amor por você! Por me inspirar, me motivar nessa busca, que é o que realmente interessa nessa vida. Sem você, meu mundo é diferente. Estou tão feliz!

Quanto a "Você", está em
http://www.youtube.com/watch?v=4PE1FWg3gJY

Abraço-te, com tanta saudade.
Teu,
Albuquerque.