domingo, 16 de agosto de 2009

para viscondes e amigos

Meu Visconde, meu amado;

Você e essa sua ironia fina e sutil capaz de fazer as mulheres suspirarem, ávidas pelos galanteios que lhe são tão próprios. Quanto a mim, vejo-te com o indecifrável sorriso no canto da boca a deixar-me dúvidas. E ainda sobre estas, também não estou certa se me aflijo mais com a incerteza que me ronda quanto as tuas lisonjeiras palavras ou quanto a mim mesma. De todo modo, não me parece correto atribuir-me essa capacidade de acalmar as almas transtornadas, mesmo aquelas que se manifestam em resmungos. Além do mais, justo você, meu caro, como poucos, é testemunha de que não sou de paz. Ah, não! Muito antes pelo contrário, são as tormentas que me fascinam, são as revoluções.

As que aconteciam nas avenidas estudantis dos idos 68, cheias de sonhos, de ideais, de censuras a provocar a criatividade e a beleza das metáforas... Ah, como queria mais disto. Mas, não é só com saudade que visito estas cenas. A saudade faz tudo morar no passado e o sentimento que me assola traz a urgência a reboque, quero fazer presente a intensidade no que vivo hoje, tenho necessidade de matar a fome de verdade emocional.

Não sei em qual momento eu deveria trocar o verbo amadurecer pelo envelhecer. Não sei sequer se já passei da hora e fico por aí a mercê da galhofa alheia. Mas sei, isso sim, que a gratuidade de tudo que a vida tem, típica fantasia da juventude, já se foi. O sucesso, a riqueza, o bem-estar, a saúde, a beleza da forma, a alegria, o crédito, o reconhecimento, a realização e o que mais você quiser supor na vida é consequência de trabalho, insistência, teimosia mesmo. E alguma sorte... que como diz meu cunhado, os craques tem que ter sorte.

Desta feita, não me desespero mais na tentativa em vão de encontrar quem me faça feliz. Quero quem me faça companhia na felicidade que eu possa encontrar por mim e, já que é inevitável, também nos tempos, às vezes longos, de frustração e dor.

Aliás, dor é uma palavra que as pessoas têm horror, mesmo sabendo que não há economia que nos previna, e não há prevenção que nos proteja dela. Há de vir como a estiagem e a chuva sempre chegam. Nossa questão passa a ser o desenvolvimento de recursos, então. E não há recurso maior que o encontro amoroso. Intenso e verdadeiro, mas também cálido e apaziguador. Gratuito? Jamais. Antes, é preciso que seja caro, dispendioso de tempo, de energia, de investimento. Nada ao acaso, quase tudo conquista. É preciso que se tenha consciência do amor. E absolutamente necessário que se tenha medo de perdê-lo (mesmo sabendo antecipadamente que isto é inevitável). Mais imprescindível ainda, no entanto, é o medo de abandonar-se. Não é o outro que nos impede, que nos aprisiona, que nos torna dependentes. Somos nós que o fazemos por nossa própria incompetência. O outro, ou o amor, nos serve apenas como pretexto. Um mau pretexto. Um mau uso.

Sobre a liberdade, aquela para qual nunca é uma palavra que não existe, tomemo-la pela mão. Não há amarra mais singela posto que desprovida de força.

Meu amigo, as revoluções acontecem também no silêncio. Há na insatisfação uma força motriz de transformação: Um dedo apontado para a necessidade de fazer de outro modo, de rever o estabelecido, de sair da repetição do que nos leva ao mesmo destino.

É por aí que tenho andado, entre revoluções, reviravoltas e silêncios... Um tanto longos, é verdade, mas necessários, posto que neles me escuto com eco, e sem interferências.

Só mais uma coisa: saudade é testemunho, de que vida(!) houve. Quero guardá-la toda, como coisa minha, daquelas que não abro mão.

Beijo-lhe, desta vez na boca, por exigir de novo a minha voz. Para dizer-te, disse-me antes. Muito obrigada.
Guilhermina

3 comentários:

Nine de Azevedo disse...

Querida rainha ,tenho saudades de ti ,ja que a ultima vez no Rio ,nao nos vimos,e seu texto tao bonito como sempre ,me atingiu nessa manha de segunda feira."Quero quem me faça cia na felicidade que eu possa encontrar em mim",foi muito inspirador ,como pensamento!Tento de uns meses para ca ,aceitar e viver isso,é dificil.Mas tambem percebi que é o caminho.Nossa felicidade nao pode estar nos outros.bjs saudosos

Janaina Amado disse...

"É po ai que tenho andado, entre revoluções, reviravoltas e silencios..." Eu também, rainha. E memórias - que se transformam em presentes.

Maria disse...

Respeito e admiro as revoluções no teu silêncio. Mas regozijo-me mesmo é quando ele se veste de palavras e passeia aqui nesta esquina. Meu beijo, Guilhermina.