Quinta-feira, ao final da tarde, meus últimos hospedes se foram. Hoje depois da academia, café com as amigas e o professor, vim para casa fazer meu almoço. Coloquei minha identidade secreta de "supermaria" e como não tinha trabalho remunerado; fui limpar meu apartamento. Varrer, passar pano, lavar e pendurar roupas, passar enceradeira (trabalhos arcaicos...). Não escutei música, resolvi ouvir o silêncio. Pensar, refletir. Sobre as visitas dos últimos; as conversas; o saldo positivo e negativo desses reencontros familiares, das coisas que aconteceram aqui em casa, no bairro, na cidade, no país etc... é assim que abro e fecho as gavetas da memória, por compartimentos, do menor para o maior (a imagem das gavetas é da bailarina Susanna).
Concluo que, apesar de tudo, diria como o pai do Balzac, fort comme un arbre, beau commme marbre. Não que eu esteja sendo pretensiosa não. “Bonita” aqui é no sentido de estar bem, apesar dele, dela... de qualquer um ou uma que se interponha. Vou resistindo, apesar do choro, da dor, da mágoa. Fiz amigos novos, tenho feito exercícios regularmente, vou caminhando.
Tomo cuidado para não calar meus sofrimentos, para não comprimir meus sentimentos, senão serei traumatizada a vie!
Quando estamos sós, devemos ter cautela para não confundir estar solitário com ser egoísta. A semelhança às vezes é grande. Começamos a ter hábitos que viram manias e no futuro podem nos predispor ao isolamento, a não suportar a presença de um outro.
Uma tristeza fica impressa no rosto, de tanto viver de capitulações e frustrações cotidianas. Faz-se necessário travar um combate contra esses sentimentos de abandono, rejeição e melancolia que nos acomete. Não me entendam mal, de vez em quando dou pity-party fabulosas. Mas são como uma rave, só duram 24Hs Depois desse prazo, me obrigo a sair, a ver gente, a telefonar para alguém. Então começo a emergir de novo. Sem anti-depressivos, de cara limpa. Dia 30 de abril fará 1 ano e 3 meses do fato que se abateu sobre mim. Fui fundo dessa vez, em regiões abissais. Mas estou começando a subir, com falta de oxigênio, mas subindo, inexoravelmente...
Tenho contado com a bondade de estranhos. Ao contrário de Blanche du Bois, nunca contei. Mas os estranhos tem sido melhor e maior alento que os outros.
Se escrevo esse meu folhetim, sem nenhum pudor ou pretensão, é para que possa servir para outros e para minha própria constatação. Como um relatório da alma: para outros não se sentirem tão sós, tão desamparados, in HELL!
O inferno, na maioria das vezes, está em quem está ao nosso lado. Havíamos abraçado o capeta. Outras vezes, dentro da gente mesmo. Não importa! Saia de lá, peça ajuda, mas saia correndo! Muitas vezes, sozinhos, não dá... precisa-se de ajuda profissional: psicólogos, psiquiatras. Mas tente se ajudar, babysteps, mas vá!
Não pense em ficar logo feliz; bem. Para mim, um dia sem chorar é um dia bom. Uma noite em que dormi, sem remédios 6hs, é um presente. Como uma doença mesmo. Precisamos sair da UTI, ir para o quarto de hospital, sair do hospital, ir para casa, estar convalescente... etc, até estar curado. Não queime etapas, as fases são necessárias para a doença não voltar. Perderá amigos (?!) nesse percurso, ganhará outros. Dê uma chance para você e para os outros.
Um ser sem paixões, amor e sofrimento designam bem o termo, é um monstro, ou um santo. Mas não é humano. Algumas pessoas tem esse destino fatal, ou o forjam, não tem paixões. Não sofrem, não morrem, nem vivem de amor. Dizem que ficam bem sozinhos... Não os invejo, não.
Quem tem uma alma como a minha, sonhadora, lírica, amorosa e delicada, mas forjada em aço, forçada a viver sem amor, vai se desesperar. Ou lutar até encontrar de novo um amor, ser correspondida e renascer de novo. Questão de escolha. Sejamos fênix!
beijos à rainha Guilhermina e ao povo da esquina
Nine de Azevedo