Rita, que já nos visitou algumas vezes nesta esquina, vive a me atazanar a idéia com as dificuldades da nossa língua. Parece até que ela permanece à espreita, em tudo quanto é esquina, a zombar de pequenas confusões e grandes tropeços entre pessoas, que tentam obter sucesso no desafio de comunicarem-se. Eu não gosto, mas sou obrigada, vira e mexe, a concordar com ela.
Outro dia mesmo estive às voltas com a palavra poder. Como que uma mesma palavrinha, destas tão pequenas que nem podemos brincar de separar-lhe o radical de prefixos e sufixos, que usamos a três por quatro, sem nem titubear ou pensar duas vezes... que é verbo e é também substantivo... como pode (ops) esta coisa tão banal ser tão bipolar? Como pode (olha ela aí de novo, gente!) nos servir para falar de possibilidades, de aptidão, de motivo e razão e como que transvestida, ou obsedada por outra personalidade, outorgar-se ares de domínio capaz até de vociferar proibições.
Ok, eu concordo que tenho problemas com o poder. Basta elevar o tom da voz para que eu não escute o conteúdo. Sou contra. Não farei. Discordo. Toda tentativa de acuar-me à submissão parece pílula mágica de efeito rebote: vai na veia, sobe ao coração que bombeia pelo corpo inteiro uma reação em cadeia de recusa e revolta. O poder clássico, poder determinado por patentes me é tão anacrônico, que na melhor das hipóteses, me provoca o riso. E o riso, é claro, soa àquele que se define por seus galões como puro deboche, o que lhe enfurece. Jamais saberão responder uma pergunta: por que deveria lhes obedecer? Não chegam nem um passo além do “porque eu estou mandando”.
Há também o poder de merda: aquele que pode fazer muito pouco para encontrar a solução, mas possui muita intimidade com a capacidade de atrapalhar. Diante deles, o inferno é muito próximo. Repartições estão abarrotadas de seus exemplares. Seu efeito é imediato e se caracteriza por ser o caminho mais curto para te levar ao mais alto índice de irritabilidade e exasperação. São excelentes testes para o seu autocontrole. Se lhe for possível controlar o ímpeto de tomar-lhes o pescoço numa esganadura que só arrefece quando o ar cessa, você avança umas cem casas rumo ao paraíso. Afrontá-los, no entanto, não costuma ser de grande inteligência. É preciso por em prática a arte do contorno. Fingir obedecer-lho costuma ser uma armadilha mais eficaz, que lhe enche o saco da vaidade fornecendo-lhe o prazer necessário para “te ajudar”. Entendeu? Ele vai fazer porque quer! Porque hoje está de bom humor. Não é porque é sua função, seu trabalho... nem porque é o correto... Não, nada disso. Ele vai fazer porque foi com a sua cara. E regozije-se deste pequeno triunfo, enfiando a sua vaidade no saco e dando-se por satisfeito e consolado de ter conseguido o que queria... E de que ele é um infeliz, por certo.
Mas, exasperação mesmo, desespero e desolação, suplício e terror é o poder da vítima! Desse, quero toda a distância que puder percorrer. Entrego todas as minhas milhas para voar até Pasárgada, e se não der, vou de navio e de trem para Tombucutu! Essa história de que eu tenho que obedecer, fazer tudo que você mandar, porque você é uma pobre coitada, acometida por alguma tragédia da vida... Essa é para aniquilar até com nervos de aço.
É claro que não estou falando dos momentos das grandes dores. No luto, no diagnóstico de uma enfermidade, na separação de alguém amado e sabe lá em mais o que, que afinal cada um é que sabe o que lhe é insuportável... tô dentro, tô perto, tô junto no meio da madrugada, debaixo da chuva ou em pleno deserto. Mas há solitários, há viúvos, há doentes de uma vida inteira... que se recusam à reconstrução para angariar a compaixão alheia. Não podem perder de jeito nenhum o álibi que lhes justifica a tirania. Engolem a vida dos filhos, parasitam dias e noites dos amigos, e por aí vão chefiando cadeias de infelicidade, em efeito dominó. Tô fora! Vê se me erra... e não adianta vir com o jogo de culpa, que não caio. A vítima tem certeza que eu sou má e insensível às dores alheias e eu tenho certeza que não há crueldade maior que a sua. Ficamos assim e que nos julguem os céus e os infernos!
Fui
Um beijo,
Guilhermina
Outro dia mesmo estive às voltas com a palavra poder. Como que uma mesma palavrinha, destas tão pequenas que nem podemos brincar de separar-lhe o radical de prefixos e sufixos, que usamos a três por quatro, sem nem titubear ou pensar duas vezes... que é verbo e é também substantivo... como pode (ops) esta coisa tão banal ser tão bipolar? Como pode (olha ela aí de novo, gente!) nos servir para falar de possibilidades, de aptidão, de motivo e razão e como que transvestida, ou obsedada por outra personalidade, outorgar-se ares de domínio capaz até de vociferar proibições.
Ok, eu concordo que tenho problemas com o poder. Basta elevar o tom da voz para que eu não escute o conteúdo. Sou contra. Não farei. Discordo. Toda tentativa de acuar-me à submissão parece pílula mágica de efeito rebote: vai na veia, sobe ao coração que bombeia pelo corpo inteiro uma reação em cadeia de recusa e revolta. O poder clássico, poder determinado por patentes me é tão anacrônico, que na melhor das hipóteses, me provoca o riso. E o riso, é claro, soa àquele que se define por seus galões como puro deboche, o que lhe enfurece. Jamais saberão responder uma pergunta: por que deveria lhes obedecer? Não chegam nem um passo além do “porque eu estou mandando”.
Há também o poder de merda: aquele que pode fazer muito pouco para encontrar a solução, mas possui muita intimidade com a capacidade de atrapalhar. Diante deles, o inferno é muito próximo. Repartições estão abarrotadas de seus exemplares. Seu efeito é imediato e se caracteriza por ser o caminho mais curto para te levar ao mais alto índice de irritabilidade e exasperação. São excelentes testes para o seu autocontrole. Se lhe for possível controlar o ímpeto de tomar-lhes o pescoço numa esganadura que só arrefece quando o ar cessa, você avança umas cem casas rumo ao paraíso. Afrontá-los, no entanto, não costuma ser de grande inteligência. É preciso por em prática a arte do contorno. Fingir obedecer-lho costuma ser uma armadilha mais eficaz, que lhe enche o saco da vaidade fornecendo-lhe o prazer necessário para “te ajudar”. Entendeu? Ele vai fazer porque quer! Porque hoje está de bom humor. Não é porque é sua função, seu trabalho... nem porque é o correto... Não, nada disso. Ele vai fazer porque foi com a sua cara. E regozije-se deste pequeno triunfo, enfiando a sua vaidade no saco e dando-se por satisfeito e consolado de ter conseguido o que queria... E de que ele é um infeliz, por certo.
Mas, exasperação mesmo, desespero e desolação, suplício e terror é o poder da vítima! Desse, quero toda a distância que puder percorrer. Entrego todas as minhas milhas para voar até Pasárgada, e se não der, vou de navio e de trem para Tombucutu! Essa história de que eu tenho que obedecer, fazer tudo que você mandar, porque você é uma pobre coitada, acometida por alguma tragédia da vida... Essa é para aniquilar até com nervos de aço.
É claro que não estou falando dos momentos das grandes dores. No luto, no diagnóstico de uma enfermidade, na separação de alguém amado e sabe lá em mais o que, que afinal cada um é que sabe o que lhe é insuportável... tô dentro, tô perto, tô junto no meio da madrugada, debaixo da chuva ou em pleno deserto. Mas há solitários, há viúvos, há doentes de uma vida inteira... que se recusam à reconstrução para angariar a compaixão alheia. Não podem perder de jeito nenhum o álibi que lhes justifica a tirania. Engolem a vida dos filhos, parasitam dias e noites dos amigos, e por aí vão chefiando cadeias de infelicidade, em efeito dominó. Tô fora! Vê se me erra... e não adianta vir com o jogo de culpa, que não caio. A vítima tem certeza que eu sou má e insensível às dores alheias e eu tenho certeza que não há crueldade maior que a sua. Ficamos assim e que nos julguem os céus e os infernos!
Fui
Um beijo,
Guilhermina
6 comentários:
Amada Guilhermina
Pelo visto tiveste um fim de semana de revoltas...Poderes sao como na musica podres poderes.O da vitima concordo com voce é o mais pesado.Ja que as vezes é dificil de perceber.Ha que usar muito discernimento para nao cair nessa armadilha.Tive uma dessas assim ,tiranica em suas dores ,solitaria ,que nao tentou refazer sua vida e que passou a "viver para seus filhos"!Valha -me qualquer coisa nessa hora,é um tormento!Estou livre.bjs
Eita que me sacudiu por dentro e por fora esse texto, hein Rainha!
Mas tudo bem, assim que eu digeri-lo conversamos sobre. Se puder ser na varandinha, ótimo..rs
Beijos da sua Princesa!
Obrigado por ter passado no "Nunca Estarei Satisfeito".
Manteremos Contato.
Um abraço.
Guilherme Abacaxi.
Rainha, esse Guilherme aí é o meu irmão, sabia? rs
Adorada Guilhermina,
Que Poder o teu! O da mente!
Um beijo desse teu amigo, que só fica satisfeito quando fica satisfeito.
Um abraço também para o nunca satisfeito Ananás.
E para vcs, princesas, o carinho de sempre.
Albuquerque.
Sus-pensa, "adivinhei" que era o seu irmão. rsrs. Aguardo sua digestão.
Nine, o fds foi tranquilo... kkkkk
Visconde, vc sempre me deixando ruborizada com seus gracejos.
Guilherme, seja bem-vindo nesta esquina... defina vc.
Bj
Guilhermina
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